quinta-feira, 28 de março de 2013

Direito de Família: A Filiação.


Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos. Não necessariamente decorre de uma relação de parentesco consanguíneo, mas de um modo ou de outro sempre implicará em um liame de parentesco na linha reta e em primeiro grau.

Quando falamos em filiação decorrente de parentesco consanguíneo estamos falando de apenas um tipo de filiação, a biológica. Nela existe uma relação genética entre pai e filho. Ela foi durante muito tempo a base  do vínculo parental.

Ao lado da filiação biológica temos a filiação biológico-presumida: aquela que decorre da presunção pater is (artigo 1.597, CC), e que pode ser subdividida em duas categorias: a que tem por substrato os lapsos temporais do início da convivência do casal e fim da sociedade conjugal (I e II); e a que decorre do biodireito nas relações matrimoniais (III, IV e V).

Há, ainda, a filiação sociológica, também chamada de vínculo de adoção, hoje regida integralmente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, por força da Lei 12.010/09.

Por fim, a filiação afetiva, uma nova modalidade. Ela decorre do vínculo ou relação de afeto entre as pessoas. Daí a possibilidade da ação investigatória de paternidade socioafetiva, amplamente agasalhada pelo STJ, inclusive de forma incidental em inventários.

Alguns doutrinadores ainda incluem a filiação ilícita, que é aquela que tem por origem a famosa "adoção à brasileira", situação em que uma pessoa reconhece como seu o filho de outra.

Então, recapitulando os tipos de filiação:

Biológica                              (laço genético)
Biológico-presumida            (presunção de laço genético)
Sociológica                           (vínculo de adoção)
Afetiva                                  (relação de afeto)
Ilícita                                     (adoção à brasileira)

A Constituição Federal apresenta uma série de princípios vetores da proteção do vínculo de filiação:

Princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF) - despatrimonializa as relações familiares e busca a integração de todos os seus membros, de forma plena.

Princípio da autodeterminação (art. 226, §7º, CF) - o planejamento familiar é de livre decisão do casal, cabendo ao Estado implantar as políticas públicas, garantir acesso à concepção assistida e educar a população de forma plena em relação a métodos contraceptivos, evitando, inclusive, a proliferação de doenças.

Princípio da paternidade responsável (art. 226, §7º, CF) - determina que em matéria de filiação, compete aos pais a adoção de todos os meios para garantir o pleno desenvolvimento dos filhos.

Princípio do desenvolvimento integral (art. 227, caput, CF) - prioriza a criança e o adolescente como os mais vulneráveis dentro do sistema protetivo, implicando, em pleno acesso aos direitos individuais e sociais.

Princípio da isonomia (art. 227, §6º, CF) - garante aos filhos os mesmos direitos, independentemente da origem, e proíbe qualquer designação discriminatória.

Princípio da veracidade genética - garante aos filhos, de forma universal e gratuita, acesso aos exames de DNA a fim de comprovar a origem biológica da filiação.

Princípio da desbiologização da paternidade - estabelece o direito aos filhos de conhecer a origem biológica da filiação, sem necessidade de constar no assento, a referida origem, de forma obrigatória.

Princípio da afetividade - de todas as relações familiares prepondera hoje a família eudemonista e o direito à ação investigatória socioafetiva, como modelo principal.

Enumerados os princípios, vamos ao reconhecimento da paternidade, que pode ser forçado ou voluntário.

O forçado ocorre por meio da ação investigatória de paternidade, que pode ser: a) ação investigatória de ascendência genética (identificação dos vínculos parentais); e, b) ação de investigação de filiação socioafetiva.

O voluntário é ato unilateral (artigo 1.607, CC), receptício (artigo 1.614, CC), irrevogável (artigo 1.610, CC), formal (artigo 1.609, CC) e pessoal, podendo até, excepcionalmente, ocorrer por procuração.

Existe uma situação intermediária entre o reconhecimento voluntário e o reconhecimento forçado, e que é a já mencionada presunção pater is.

O reconhecimento tem sua forma estabelecida no artigo 1.609, I a IV, CC, destacando-se o inciso I, que é o realizado por ocasião do assento de nascimento.

Temos ainda o reconhecimento administrativo ("suposto pai"), previsto na Lei 8.560/92. Nele o oficial questiona à mãe sobre o suposto pai, encaminhando depois ao juiz uma certidão do assento e as informações obtidas. Ao magistrado competirá a oitiva da mãe e do suposto pai por ela indicado.

O registro também merece tratamento, então vamos a ele. A Lei 12.662/2012 assegurou validade nacional à Declaração de Nascido Vivo - DNV. Essa mesma lei também alterou a redação do artigo 54 da Lei 6.015/73, impondo aos oficiais dos registros civis das pessoas naturais o dever de lavrarem o assento de nascimento mesmo que a DNV contenha omissões e divergências:

Art. 54. O assento do nascimento deverá conter:

[...]

10) número de identificação da Declaração de Nascido Vivo com controle do dígito verificador, ressalvado na hipótese de registro tardio previsto no art. 46 desta Lei.

§1º Não constituem motivo para recusa, devolução ou solicitação de retificação da Declaração de Nascido Vivo por parte do Registrador Civil das Pessoas Naturais:

 I - equívocos ou divergências que não comprometam a identificação da mãe;

II - omissão do nome do recém-nascido ou do nome do pai;

III - divergência parcial ou total entre o nome do recém-nascido constante da declaração e o escolhido em manifestação perante o registrador no momento do registro de nascimento, prevalecendo este último;

 IV - divergência parcial ou total entre o nome do pai constante da declaração e o verificado pelo registrador nos termos da legislação civil, prevalecendo este último;

 V - demais equívocos, omissões ou divergências que não comprometam informações relevantes para o registro de nascimento.

 §2º O nome do pai constante da Declaração de Nascido Vivo não constitui prova ou presunção da paternidade, somente podendo ser lançado no registro de nascimento quando verificado nos termos da legislação civil vigente.

 §3º Nos nascimentos frutos de partos sem assistência de profissionais da saúde ou parteiras tradicionais, a Declaração de Nascido Vivo será emitida pelos Oficiais de Registro Civil que lavrarem o registro de nascimento, sempre que haja demanda das Secretarias Estaduais ou Municipais de Saúde para que realizem tais emissões.

O Conselho Nacional de Justiça, por meio dos Provimentos 13, 16 e 17, entre outros, vem buscando aprimorar o reconhecimento de paternidade a fim de dar efetividade à isonomia dos filhos. Nessa linha de raciocínio, garante o Provimento 16 o reconhecimento de paternidade por parte do suposto pai ou da mãe ou do filho maior, podendo efetuar apontamento em qualquer unidade de registro civil do País.

Feita essa rápida exposição do tema, finalizamos por reafirmar a importância dos oficiais dos registros civis das pessoas naturais como os guardiães de relevantes atos indispensáveis ao exercício da cidadania, sem os quais direitos como o de filiação não restariam adequadamente garantidos.

Saudações a todos os registradores civis das pessoas naturais.

DR. PHELIPE DE MONCLAYR P. C. SALIM

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